Esquecer Godot

Bem-vindo aqui! Este blog é meu. Quero-o. Para que as palavras não se esqueçam de mim. Para que o meu ser jamais se dilate, como que envergonhado. Se não esquecermos Godot, ele esquece-se de nós. Se me esquecer de mim, tudo me olvidará. Sê bem-vindo a mim.

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Location: Lisboa, Lisboa, Portugal

Monday, October 31, 2005

Movimentos circulares

Ele saboreava o chão do quarto com as mãos. Em movimentos circulares, os poros desprotegidos da sua pele, voltavam-se para dentro, em fuga da imundez acumulada. Deitado, de olhos fechados. A sua face piscava um choro por vir. Aguentou. Ergueu-se do solo, como um girassol em busca da luz que espreitava pelos estores. Sentou-se na cama, fitando o chão. Coçou o nariz em busca de alívio. Ao levantar-se, imaginou-se o primeiro hominídeo que se erguera totalmente. Ia agora em busca do fogo e de armas. Saiu de casa apressado e ainda de pijama, eram duas da manhã. Ela morava na vivenda ao lado e as luzes ainda estavam acordadas. Tocou à campainha, ela abriu. Entra, disse-lhe. Ele entrou. A porta separou-os do mundo. Agarrou as suas coxas e cheirou-lhe profundamente a face. As suas mãos percorreram-lhe o corpo todo, deixando-a ofegante. Ela levou-o de mão dada do corredor para a sala. Apagou as luzes e começou a dançar ao som do silêncio. Ele olhava-a, iluminada pela luz da lua. Aproximou-se. Juntou-se ao silêncio para ser dançado por ela. Sentou-se a fumar um cigarro. O fumo marcava o ritmo da sua dança. Levantou-se em busca dum beijo. Ligados por um qualquer cordão, levitaram até ao solo alcatifado. Em movimentos circulares, os poros desprotegidos dos seus corpos, voltaram-se para fora, em fuga da solidão.

Lucas Madrugada

Tuesday, October 18, 2005

"Dor de costas"

Se ando para aqui a gritar é para ver se esqueço a dor que tenho nas costas
talvez tenha partido alguma costela ontem a jogar à bola
enfim, o que interessa é que não paro de gritar

Com esta dor nas costas e com estes gritos sonho-me político carismático
para pôr todos os meus amigos em cargos de chefia
basta que venham cá a casa todos os dias fazer-me massagens em todo o corpo
juro que se me tirarem daqui serei o vosso escravo para sempre

Todavia o mais importante é que isto passe
e que volte à minha dor normal.

Lucas Madrugada

Tuesday, October 04, 2005

"Amor-talvez"

À beira do precipício eu me ri
e tu me calaste com medo

As gargalhadas ressuscitavam ecos
repetitivos
angustiantes para um simples eu
que perguntava: eu pergunto?
e os ecos nada,
calados como tu não estavas

À beira do precipício apavorei-me
e tu me amparaste calada

tu calada
os ecos nada

À beira do precipício eu morri
e tu te calaste para nada

Lucas Madrugada